Elvis em Hollywood: Os filmes do início dos anos 60

AUTOR: JORGE CARREGA

     

Elvis em Hollywood: Os filmes do início dos anos 60

Quando Elvis regressou do serviço militar em meados de 1960 encontrou um panorama musical  bastante diferente da década de 50.

Cantores polémicos como Jerry Lee Lewis, Chuck Berry e Gene Vincent tinham perdido popularidade e outros como Buddy Holly, Eddie Cochran ou Ritchie Valens haviam falecido. Entretanto uma nova geração de cantores pop influenciados pela tradição musical de Tin Pan Alley, como Paul Anka e Bobby Darin, provava que os adolescentes americanos não gostavam só de rock and roll. Por outro lado Ricky Nelson, Roy Orbison e Sam Cooke com a sua música pop  mais polida dominavam os tops  o que levou o Coronel Parker a  supor que a América  tinha perdido o interesse pelo rock and roll.

O mesmo sucedeu com Hal Wallis o produtor que trouxera Elvis para Hollywood. Wallis não duvidava do carisma e popularidade de Elvis mas acreditava que o público deseja ver o cantor interpretar personagens mais maduras, numa versão jovem de galãs como Dean Martin e Rock Hudson em filmes direccionados para um público familiar, diferente  da imagem de  jovem rebelde que tanta agitação provocara na década anterior.

Deste modo o produtor decidiu lançar Elvis num conjunto de comédias musicais que seguiam a  tradição iniciada pela Paramout nos anos 30 com os filmes de Bing Crosby e continuada pelo próprio Hal Wallis com os filmes da dupla  Dean Martin e Jerry  Lewis.

Com as suas histórias românticas, situações cómicas e números musicais em cenários exóticos, os filmes protagonizados por Elvis no início dos anos 60 foram imediatamente negligenciados pela crítica cinematográfica que os classificou de travelogues.

No entanto apesar das semelhanças que estes filmes apresentam entre si, eles não foram “inventados” para explorar a popularidade de Elvis, correspondendo antes a um modelo de entretenimento que já existia em Hollywood desde os anos 30.

Na verdade uma análise atenta dos argumentos destes filmes e do modo como integram os números musicais permite-nos identificar diversos sub-géneros do cinema musical na filmografia de Presley.

Se na sua esmagadora maioria os filmes deste período se podem classificar como comedias musicais, claramente distintos dos dramas musicais dos anos 50, a verdade é que entre os filmes produzidos de 1960 a 1964 (G.I Blues a Tickle Me) podemos identificar películas com características distintas.

Deste modo, filmes como Blue Hawaii e Viva Las Vegas constituem exemplos dos chamados Farytale Musicals, descendentes directos dos filmes protagonizados por Maurice Chevalier nos anos 30 enquanto Girls, Girls, Girls ou Roustabout são Folk Musicals. A diferença reside não apenas nos cenários em que as histórias são situadas, mas também no tipo de relação que se verifica entre o par romântico.

Outro aspecto que diferencia os filmes protagonizados por Presley nos anos 60 é a utilização dos números musicais. Nos filmes da década de 50 estas cenas eram quase sempre apresentadas como interpretações do personagem/ cantor que actuava num palco seguindo a estrutura básica do musical Revue dos anos 30 e início dos anos 40 como por exemplo Brodway Melody of 1940 de Norman Taurog. Pelo contrário, nos filmes dos anos 60 é muito frequente surgirem números musicais integrados em cenas domésticas. Em G.I Blues, uma comédia musical na tradição das “service comedies” populares desde os anos 30, Elvis canta no chuveiro, no comboio e até uma canção de embalar a um bebé e em Blue Hawaii canta no carro, na praia e na prisão.

Naturalmente, ao contrario de Loving You, Jailhouse Rock e King Creole, nos filmes protagonizados por Elvis durante os anos 60 a maioria das canções dependem directamente da história para fazerem sentido, não apenas ao nível das letras mas também das melodias que incorporavam uma grande diversidade de elementos musicais anteriormente ausentes dos filmes e da musica de Presley. É por este motivo que em G.I Blues, cujo cenário é a Alemanha são utilizadas melodias populares como “Muss I denn” que se transforma em Wooden Heart·  ou “Barcarolle” dos Contos de Hoffman de Jacques Offenback refeito como “Tonigth It’s So Rigth for Love”. Por outro lado em Blue Hawaii  Elvis canta temas tradicionais como “Aloha Oe” e “Ku-u- i- po” e apresenta a balada “Cant Help Falling in Love with You” baseada numa melodia francesa do séc. XIX, facto justificado pelas origens francesas de uma das personagens.

 

Esta utilização da música era comum em Hollywood resultando naquilo que é conhecido como o “musical integrado” em que o tema musical cumpre em parte uma função de diálogo ajudando a avançar a história, pelo que as letras e até as melodias estão intimamente relacionadas com uma cena específica do filme, facto que dificulta a sua apreciação por parte de um público que não tenha visto o filme. Deste modo canções como “ Song of the Shrimp”, “The Bulfigther was a Lady”, “Wooden Heart” ou “The Lady Loves Me” podem parecer anacrónicas na discografia de Elvis e bastante difíceis de aceitar por parte dos puristas do Rock, mas quando vistas e ouvidas no contexto das cenas dos filmes para as quais foram criadas fazem sentido.

Apesar de serem profundamente desvalorizados quer pelos puristas do cinema musical, quer pelos puristas do rock, os filmes protagonizados por Elvis durante os primeiros anos da década de 60 inserem-se na tradição da comédia musical de Hollywood para a qual  o cantor contribuiu com alguns dos últimos e maiores sucessos dos anos 60, conquistando desse modo um lugar na historia do cinema como a ultima grande estrela masculina deste género cinematográfico.

 

Jorge Carrega